sexta-feira, 19 de julho de 2013

Treinamento esportivo na infância

O conhecimento sobre o efeito da atividade esportiva na vida de uma criança é, muitas vezes, ignorado porque, com raras exceções, o esporte está nas mãos de pessoas cuja competência é questionável.
É senso comum acreditar-se que o esporte ajuda a criança a aprender a lidar com os problemas que a esperam na vida adulta, sendo assim, um instrumento que dá oportunidades à mesma de resolver seus conflitos psicológicos na fase do crescimento.
Porém, a criança possui particularidades que devem ser respeitadas, como sua tendência em ver os pais e outros adultos (professores e técnicos) como sendo infalíveis, sendo que, estes adultos, em muitos momentos, não se preocupam realmente em questionar os valores éticos da competição e o bem estar psicológico para estas crianças.
A incapacidade de uma criança atleta em atender com sucesso à demanda da performance em uma situação competitiva, pode resultar num sentimento de incompetência e de falha, que ameaça sua auto estima e contrasta com seu egocentrismo (principalmente, sua inabilidade de distinguir entre sua própria perspectiva dos eventos com a dos outros);
Comportamentos opressivos, reguladores e autocráticos dos pais, treinadores e professores, podem fazer com que as crianças sintam-se ameaçadas, causando um alto índice de stress nas mesmas.
Ainda segundo o senso popular, através de esportes organizados, a criança experimentaria os estados emocionais associados com a vitória e a derrota, através da exposição aos conflitos inerentes.
O esporte também confrontaria a criança com a escolha do certo e errado, honestidade ou desonestidade. Ainda nesta visão, o esporte propiciaria o aprendizado que poderia permitir à criança experimentar o stress progressivamente sem sofrer as conseqüências associadas com a passagem abrupta para a vida adulta
Mas, segundo Piaget, o desenvolvimento da moralidade acontece normalmente em todas as crianças, a não ser que este desenvolvimento seja influenciado por um comportamento anormal de extrema coerção ou por privação de experiências advindas do seu convívio com seus colegas de mesmo estágio cognitivo.
Cabe ainda, ressaltar que o stress gerado pelo excesso de cobrança e pressão por resultados em uma competição esportiva, poderiam causar frustração por parte da criança, bem como o abandono e a rejeição de se envolverem em qualquer atividade física futura.
Coelho,R.W.; & Coelho, Y.B, em seu artigo “Estudo comparativo entre o nível de stress de crianças envolvidas em diferentes esportes organizados e em atividades físicas competitivas informais” apontam que talvez, o mais indicado, seria que a competição fosse introduzida progressivamente na vida da criança, começando contra seus próprios índices de performance, ou seja, a competição se processando com ela mesma.
Em um estágio seguinte, ela competiria com os índices médios do grupo a que pertence, dentro de seu próprio ritmo.
No terceiro estágio, sua participação aconteceria em atividades coletivas onde ela divida as responsabilidades de performance. Só após essa preparação, a criança seria levada a participar de atividades desportivas individuais ou individuais de contato.
Acredito que somado a estes aspectos sugeridos pelos autores, devemos também, levar em conta o caráter lúdico que medeia a ação das crianças em todas as atividades por elas exercidas. De acordo com Gouvêa:

“Em suas atividades, a criança empresta-lhes um sentido que não está na objetividade dos resultados buscados pelo adulto, mas no prazer de sua execução.”
GOUVEA, Maria Cristina Soares de. (2003) Infância, sociedade e cultura. In:CARVALHO, Alysson. et al. Desenvolvimento e Aprendizagem. Belo Horizonte: Editora UFMG.

         Desta forma, as pessoas envolvidas no treinamento esportivo de crianças deveriam, no meu entender, buscar também, em cada um dos estágios sugeridos deste treinamento, novos sentidos e formas, de modo que elas consigam se apropriar dos movimentos e saberes de cada esporte de forma gradual e divertida para os mesmos.  
Não podemos exigir que as crianças ultrapassem suas possibilidades e, se apropriem e internalizem os conteúdos dos treinamentos segundo um padrão. Devemos sim, despertar nas mesmas o desejo e a curiosidade pelos estágios seguintes.

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